A Voz da Tília

O que É Perfeito não Precisa de Nada
27 mars 2016
Os Figos Pretos
27 mars 2016

A Voz da Tília

Diz-me a tília a cantar: « Eu sou sincera,
Eu sou isto que vês: o sonho, a graça,
Deu ao meu corpo, o vento, quando passa,
Este ar escultural de bayadera…E de manhã o sol é uma cratera,
Uma serpente de oiro que me enlaça…
Trago nas mãos as mãos da Primavera…
E é para mim que em noites de desgraçaToca o vento Mozart, triste e solene,
E à minha alma vibrante, posta a nú,
Diz a chuva sonetos de Verlaine… »E, ao ver-me triste, a tília murmurou:
« Já fui um dia poeta como tu…
Ainda hás de ser tília como eu sou… »

Florbela Espanca (1894-1930),
in « Charneca em Flor », 1931