Corema album – Camarinha

captítulo composto por numerosas flores, lava-pé, viomal – Cheirolophus sempervirens
Cheirolophus sempervirens – Lava-pé
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Cornus mas – Cerejeira-corneliana
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Camarinha, Camarinheira

A Camarinha

A camarinha é certamente um dos arbustos mais relevantes da nossa costa, onde é endémica. Nas dunas, as moitas almofadadas e femininas cobrem-se de bagas brancas, como pérolas, translúcidas ou rosadas, que lhes salpica o verde, sobretudo a partir de Agosto. Estas pequenas bagas, comestíveis, sumarentas, com sabor moderadamente ácido e cítrico, contêm antioxidantes. Desde criança que conheço este pequeno arbusto, pelos seus frutos que encontrava no pinhalzinho do Baleal, hoje um condomínio, completamente urbanizado, duvido que lá se encontre ainda um único pé de camarinha.
O mesmo aspecto e cor de fruto, tem gerado grande interesse por parte de botânicos em poder cultivar este arbusto pelos frutos que interessam uma agricultura produtivista, voltada para a exportação, com fracos resultados até agora. No entanto, cientistas descobriram na camarinha substâncias com efeitos anticancerígenos.
Porém, a camarinha tem vindo a sofrer uma constante diminuição do seu habitat. Este espaço tem sido procurado para plantações florestais, com o argumento de travar o avanço das dunas, desde há séculos e hoje, pela urbanização turística e de lazer.

 

Família: ERICACEAE

Nome científico: Corema album, (L) D. Don ex Steud 1840

Publicação : 1830

Grupo: folhosa caduca

Nomes vernáculos: camarinha, camarinheira, camarinhas

 

Hábito: arbusto perenifólio até 1 m de altura, mas geralmente de 30 a 75 cm de altura, densamente ramificado desde a base; copa arredondada, forma comummente uma moita almofadada. Caules delgados, acinzentados escamosos na parte inferior e densamente folhudos na parte superior, com folhas lineares e estreitas. Trata-se de um arbusto dióico, com ramos erectos nos indivíduos masculinos e um tanto difusos nos femininos. Floração abundante em ambos os sexos, mais ou menos avermelhada. Os pés femininos produzem uma abundante frutificação de pequenos frutos branco-pérola, comestíveis.

Folhas: alternas, simples, erectas ou patentes, obtusas, revolutas com curto pecíolo persistente que tende a encostar-se ao ramo, lineares até 8-10 x 1 mm; página superior verde-escura, brilhante, glabra, mas coberta de glândulas quando jovem, página inferior profundamente sulcada. As folhas apresentam uma disposição verticilada, 3 ou 4 por cada nó.

Flores: espécie dióica, flores pequenas unissexuais em arbustos ora femininos, ora masculinos. A floração em ambos os sexos agrupa-se em inflorescências terminais com maior intensidade de Janeiro a Maio. As flores masculinas 5 a 9, as mais vistosas, dispostas em fascículos condensados possuem 3 sépalas, 3 pétalas rosadas e 3 estames livres e salientes com anteras vermelhas bastante visíveis. As femininas solitárias ou geminadas, ainda mais pequenas que as masculinas, têm 3 pétalas, 3 sépalas, estilete e estigma com 3 lóbulos vermelhos. A cor dominante, é o vermelho. A polinização das flores é assegurada pelo vento. De notar, que embora a camarinheira seja uma planta essencialmente dióica, alguns indivíduos do sudoeste da Península (Vila Real de Santo António e Doñana), apresentam inflorescências hermafroditas.

Frutos: o fruto é uma drupa globosa, carnuda, branca ou rosa claro, de 6 a 8-12 mm de diâmetro, com 3 sementes convexas, excepcionalmente 2 ou 4. Este amadurece de Julho a Setembro, possui polpa branca ou translúcida com sabor agridoce, é comestível. Os frutos permanecem na planta até Outubro a Dezembro.

Gomos: a camarinha tem gemas de duas formas comuns aos dois sexos. A gema apical é cónica e anegrada com finas listras brancas, ao aumentar de volume, a forma cónica acentua-se e apresenta uma cor amarelada com listras castanhas. Quanto aos gomos florais, estes são esféricos e lanudos.

Ritidoma: é escamoso e pardo-acinzentado nos exemplares mais velhos; quanto aos ramos do ano, estes são densamente frondosos na parte superior e cobertos por pubescência acinzentada.

 

 

Habitat: desenvolve-se em comunidades arbustivas de dunas secundárias, e vales dunares, onde frequentemente origina comunidades extremes, assim como em locais rochosos e falésias. Prefere solos ácidos, bem drenados a secos. É uma planta homeoídrica, isto é, que tem a capacidade de regular o seu teor de água controlando a transpiração. Planta heliófila que também prospere sob alguma sombra em bosques não muito densos como o subcoberto de pinhais ou a orla de zimbrais. Desenvolve-se até 1,5 km do mar, vai de 0 a cerca de 130 m de altitude e tolera temperaturas negativas ocasionais, até -5 ºC. Acredita-se que viva entre 25 e 35 anos.

Propagação: reproduz-se por semente, semear de preferência assim que os frutos amadurecerem. Por estaca também, utilize estacas semilenhificadas em Julho e Agosto, ou estas lenhificadas do ano em Novembro.

 

Distribuição geográfica: a camarinheira é um endemismo peninsular (Portugal e Espanha), comum nas dunas costeiras do Atlântico Ibérico, desde a Galiza e as Ilhas Cíes a norte, ao longo da costa portuguesa e, a sul, até à Província de Cádiz. Encontra-se naturalizada na costa da Aquitânia (Bordéus), em França, onde é rara. Nos Açores há a subespécie Corema album azorica.
Existem três grandes manchas de camarinha, nos seguintes sistemas dunares da costa atlântica:

  • Aspeillo no Parque Nacional de Doñana no sul de Espanha,
  • de Sines a Tróia na costa da Comporta, no sudoeste de Portugal,
  • da Nazaré a Ovar na Costa da Prata, no Centro-Norte de Portugal.

Existem populações disjuntas destas três grandes manchas, em penhascos e dunas de areia isoladas em todo o resto do litoral atlântico.

Em Portugal: no Continente, ocorre praticamente em toda a faixa costeira, incluindo o final da bacia hidrográfica do Tejo. Nos Açores, a subespécie Corema album azorica, encontra-se nas ilhas de São Miguel, Graciosa, São Jorge, Pico e Faial.

 

USOS

A CAMARINHA, UM PEQUENO FRUTO BRANCO

Os frutos brancos, também chamados camarinhas, são comestíveis. Possuem um sabor cítrico muito refrescante que aparentemente os humanos desde tempos imemoriais apreciam pelo prazer ou como mezinha.
Nas povoações juntas à costa chegou a haver colheita das camarinhas pelos locais, para as vender aos veraneantes. Actualmente faz-se geleia, vinagre e licor com as camarinhas, produtos que é possível encontrar nos comércios especializados. A pergunta que eu faço é a seguinte, será que existe alguma iguaria, gelado ou receita culinária tendo como base a camarinha, algures em Portugal? Talvez um cozinheiro de génio que inventasse uma receita de peixe com molho à base de camarinha, por exemplo? Se souber, partilhe connosco.

Ornamental

A camarinha, tem todos os requisitos para entrar nos nossos jardins, o porte, a cor, forma e disposição das folhas, flores masculinas bastante vistosas e sobretudos, as bagas que os pés femininos produzem, branco-pérola, translúcidas ou rosadas. No entanto, o que se constata é que fora do seu habitat, poucas camarinheiras se avistam pelos jardins ibéricos. As exigências deste arbusto que teima em não ser manipulado pela vontade dos humanos, vive somente nas suas terras, exigindo condições edafoclimáticas específicas. Razões que certamente explicam a inexistência da camarinha como arbusto de jardim, porque não a sabemos cultivar.
Mas não desanime, porque num futuro próximo, poderá usufruir de uma camarinheira repleta de frutos brancos no seu jardim. De facto, institutos e universidades, ligados à botânica, têm nestes últimos anos, levado a cabo vários estudos sobre a reprodução e domesticação da camarinheira, como arbusto frutícola. Estes estudos académicos, têm suscitado um grande interesse em organizações agrícolas e provavelmente na agricultura especulativa que antecipa a criação de um novo mercado voltado para a exportação das pequenas bagas brancas, cor invulgar nos frutos, com atributos antioxidantes.

 

COMPLEMENTAR

A camarinha endémica dos Açores

Existe nos Açores uma subespécie da camarinha, a Corema album subsp. azoricum ou azorica P. Silva, que se estabelece sobre rochas basálticas recentes até altitudes de 300 m. Esta Camarinha surge habitualmente em comunidade com a Erica azorica. É endémica em cinco das nove ilhas do arquipélago: São Miguel, Pico, Faial, São Jorge e Graciosa, onde é considerada prioritária para conservação, sendo uma das cem espécies ameaçadas de extinção. Clique para ver as imagens na flora-on

Propriedades terapêuticas anticancerígenas da camarinha

O extrato de camarinha poderá ter propriedades anticancerígenas, revelam os resultados de um estudo liderado por uma equipa da Unidade de Investigação e Desenvolvimento Química-Física Molecular, da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra. Nas várias experiências realizadas em linhas celulares de cancro do cólon, observou-se que «extratos de Corema album conseguem inibir a proliferação deste tipo de células cancerígenas».

A Camarainha Encontra-se Ameaçada

A área de distribuição da camarinha tem vindo a diminuir continuamente. Entre as várias causas estão a urbanizações de recreio, as plantações florestais de pinheiros desde o século XIII e de eucaliptos no século XX, assim como as espécies exóticas de caráter invasor como as acácias que competem agressivamente com a camarinha. Como exemplo da redução do habitat da camarinheira, temos a Galiza, em que outrora a camarinha ocupou quase toda a costa e hoje, encontra-se reduzida a pequenas manchas das Ilhas Cíes e do Cabo Vilán (município de Camariñas). No caso português, desconheço se há algum levantamento das populações de camarinha, mas basta observar a utilização que é feita do espaço costeiro, construções de estruturas e de edifícios para recreio, com fins turísticos. Esta situação tem suscitado a criação de associações de protecção da camarinha, como Corema ou ANABAM, que através de acções tentam limitar o desgaste da área natural da camarinheira, promovendo junto das populações o conhecimento deste arbusto único.

Apenas Existem Duas Espécies de Corema no Mundo

A família Corema, possui apenas duas espécies, a Corema album, endémica da costa atlântica da P.I oeste e sul e a Corema conradii (Torr.) Torr. ex Loudon, que é endémica da costa leste da América do Norte. Esta espécie bastante semelhante à Corema album, distingue-se desta ultima por não ultrapassar os 60 cm de altura, de apresentar frutos bastante menores, 2 mm de largura que são primeiro avermelhados, depois acinzentados e desprovidos de parte carnuda.

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Todas as fotografias presentes nesta ficha botânica foram tiradas no concelho de Peniche, dunas do Baleal e pinhais de Ferrel, onde a camarinha abunda.

 

A LENDA DAS CAMARINHAS

Existe uma lenda que atribui a origem das camarinhas às lágrimas da rainha Santa Isabel. Segundo esta lenda em verso, a rainha encontrou um dia o rei e poeta sem marido, D. Dinis, grande sedutor nos braços de uma outra dama. A rainha ofendida e traída, começou a chorar, um pranto que deu « frutos »: « (…) Mas cristalizou-se o pranto/ Em muitas bagas branquinhas/ E transformou-se num manto/ De brilhantes camarinhas!… »

LÁGRIMAS DA RAINHA SANTA ISABEL

Dizem que Santa Isabel,
Rainha de Portugal,
Montando branco corcel,
Percorria o seu pinhal!

– »Ai do meu Esposo! Dizei!
Dizei-me, robles reais!
Meu Dinis! Senhor meu Rei!
Em que braços suspirais?!…

Os robles silenciosos
Do vasto Pinhal do Rei
Responderam receosos
– Não sei!…

E o pranto da Rainha
Nas suas faces rolava,
Regando a erva daninha
No pobre chão que pisava!

– « Ó meu Pinhal sonhador
Que o meu Rei semeou!
Dizei-me do meu Amor
E se por aqui passou… »

Os robles silenciosos
Do vasto Pinhal do Rei
Responderam receosos:
– Não sei!…

Mas cristalizou-se o pranto
Em muitas bagas branquinhas
E transformou-se num manto
De brilhantes camarinhas!…

Eis que repara a Rainha
Numa casa iluminada…
– « Quem vela nesta casinha
Numa hora adiantada ?!… »

Os robles silenciosos,
Tão tristes que nem eu sei,
Responderam receosos:
– O Rei!…

(Poema de autor.a anónimo.a)

 

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